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A marcha à ré da Noruega

!!!Uma foto do problema antes das explicações!!!

Perda de arrecadação no PRIMEIRO ANO

Uma análise presente em fontes econômicas e citada em discussões internacionais sugere que:

  • O aumento do imposto de riqueza em 2022 estava projetado para gerar um aumento de receita de aproximadamente US$ 146 milhões no primeiro ano.

  • Mas, devido à saída de contribuintes ricos e à redução da base tributária, a arrecadação efetiva caiu em cerca de US$ 594 milhões em comparação ao que se esperava inicialmente.

  • Isso implica uma diferença de ~US$ 740 milhões entre o ganho esperado e o resultado real no curto prazo.


Há um erro econômico crônico que se repete ao longo da história das políticas públicas: avaliar medidas pelas intenções declaradas, e não pelos efeitos reais que produzem. Esse erro é particularmente recorrente em políticas tributárias “bem-intencionadas”, nas quais o debate se concentra em valores morais, justiça, equidade, solidariedade, enquanto se ignora o funcionamento concreto dos incentivos, das expectativas e do comportamento humano.

A economia, porém, não opera no plano das intenções. Ela opera no plano dos incentivos, das restrições e das escolhas racionais diante do risco. Uma política não é boa porque “pretende” reduzir desigualdades; ela só pode ser considerada bem-sucedida se de fato reduz desigualdades sem destruir os mecanismos que geram riqueza, emprego e arrecadação futura. Quando essa distinção é ignorada, o resultado costuma ser previsível: políticas moralmente satisfatórias no discurso e economicamente destrutivas na prática.

O caso recente da Noruega se insere exatamente nesse padrão. As medidas adotadas, endurecimento do imposto sobre patrimônio e introdução de um imposto de saída sobre ganhos não realizados, foram justificadas por intenções claras e publicamente defensáveis: combater desigualdades, impedir evasão fiscal e garantir que os mais ricos “paguem sua parte”. O problema não está nas intenções. O problema está no descompasso entre essas intenções e os efeitos comportamentais inevitáveis que tais medidas produzem em um mundo de alta mobilidade de capital e pessoas.

Ao tributar patrimônio produtivo e, sobretudo, ao penalizar a saída com base em ganhos ainda não realizados, o Estado altera profundamente o cálculo intertemporal de empreendedores, investidores e fundadores de empresas. A decisão relevante deixa de ser “quanto pagar de imposto” e passa a ser “onde criar riqueza, ou se vale a pena criá-la”. Esse é o ponto em que a política deixa de ser distributiva e passa a ser expulsiva, não por ideologia, mas por mecânica econômica.

A história econômica mostra que bons resultados raramente decorrem de boas intenções desacompanhadas de boa teoria. Avaliar políticas apenas pelo propósito declarado equivale a julgar um remédio pela bula, não pelos efeitos colaterais. E, quando os efeitos colaterais surgem cedo, são persistentes e afetam decisões futuras, como já ocorre no caso norueguês, o diagnóstico torna-se ainda mais claro: o erro não é pontual, é estrutural.

Esse tipo de política tende a produzir um paradoxo clássico: no curto prazo, oferece satisfação moral e ganhos fiscais aparentes; no médio e longo prazo, reduz a base produtiva, desloca talentos, antecipa a migração de riqueza e empobrece o próprio sistema que pretendia fortalecer. Quando isso acontece, a correção costuma vir tarde demais, não porque faltaram alertas, mas porque se insistiu em julgar a política pelo que ela “queria fazer”, e não pelo que ela efetivamente faz.

A Noruega, justamente por ser um país rico, institucionalmente sólido e altamente educado, pode acabar se tornando um caso didático global desse erro recorrente. Não como exemplo de más intenções, mas como demonstração de que, em economia, intenção não é resultado, e ignorar essa diferença cobra um preço alto, cumulativo e inevitável.


A população percebeu

Em pouco tempo, a própria população passa a perceber, pela experiência concreta do cotidiano, que as perdas superam em muito os ganhos prometidos. Esse é um ponto decisivo, porque marca a transição entre o debate abstrato e a realidade vivida. Quando isso acontece, a política deixa de ser julgada por slogans e passa a ser avaliada por consequências palpáveis.

No caso da Noruega, esse processo é particularmente rápido porque os efeitos não ficam confinados aos muito ricos, como sugeria a narrativa inicial. Eles se espalham pelo tecido econômico: menos investimentos, menos startups, menor dinamismo empresarial, decisões sendo adiadas ou deslocadas para fora do país. O cidadão comum talvez não acompanhe balanços fiscais, mas percebe quando oportunidades diminuem, quando projetos não saem do papel, quando o crescimento perde fôlego.

A promessa central dessas medidas era simples e sedutora: mais arrecadação, mais justiça, nenhum custo relevante para a sociedade em geral. A experiência prática, porém, começa a contar outra história. A arrecadação adicional mostra-se limitada, enquanto os efeitos negativos, ainda que difusos, acumulam-se de forma persistente. A população passa a notar que o “dinheiro novo” não aparece com a força anunciada, mas o custo econômico, embora silencioso, se torna cada vez mais presente.

Esse momento é crucial porque rompe a blindagem moral da política. Enquanto os efeitos negativos são apenas teóricos, qualquer crítica pode ser desqualificada como defesa de privilégios. Quando os efeitos passam a ser sentidos no ritmo da economia, no mercado de trabalho, na inovação e nas perspectivas futuras, a crítica deixa de ser ideológica e se torna empírica. O debate muda de tom: já não se pergunta se a intenção era justa, mas se o resultado compensa o preço pago.

Historicamente, é assim que políticas desse tipo começam a perder apoio: não por mudança súbita de valores, mas por aprendizado prático. A população descobre que a equação vendida como “ganho coletivo sem custo” não fecha. O que parecia uma correção pontual revela-se um desincentivo estrutural, e o que foi apresentado como solução passa a ser visto como parte do problema.

Em resumo, quando a realidade se impõe, a percepção pública tende a convergir para um ponto simples e poderoso: os ganhos prometidos eram modestos e imediatos; as perdas, amplas, cumulativas e duradouras. E, uma vez que essa constatação se enraíza na experiência cotidiana, a política deixa de ser defendida com convicção e passa a ser tolerada apenas por inércia, até que a revisão se torne inevitável.



Perdas brutais onde se imaginava ganhos extraordinários

1. Perda direta de arrecadação (efeito imediato)

Quando um indivíduo de altíssimo patrimônio sai do país:

  • Perde-se:

    • imposto sobre patrimônio anual;

    • imposto sobre renda futura;

    • imposto sobre dividendos;

    • impostos indiretos (consumo, serviços, investimento local).

Estudos fiscais internos e estimativas independentes indicam que a saída de poucas dezenas de indivíduos ultra-ricos pode eliminar centenas de milhões de euros em arrecadação futura.

O paradoxo:

  • Aumento de alíquotas → queda da base;

  • O imposto passa a incidir sobre menos pessoas.


2. Efeito “pipeline quebrado” (perda invisível, mas maior)

Este é o maior prejuízo e o menos mensurado.

O que deixa de existir:

  • startups que não são abertas no país;

  • empresas que nascem já offshore;

  • fundadores que mudam de país antes da valorização;

  • holdings e propriedade intelectual registradas fora.

Cada startup que não nasce implica:

  • zero imposto futuro;

  • zero empregos qualificados;

  • zero inovação local;

  • zero efeito multiplicador.

O Estado abre mão de receitas que sequer entram nas estatísticas.


3. Menos exits, IPOs e reinvestimento local

Empreendedores bem-sucedidos tendem a:

  • reinvestir em novos negócios;

  • atuar como investidores-anjo;

  • financiar ecossistemas locais.

Com o imposto de saída:

  • exits são adiados, evitados ou realizados fora;

  • IPOs migram para outras jurisdições;

  • o capital não retorna ao ciclo local.

Resultado:

  • menos dinamismo;

  • menos empresas de segunda geração;

  • menor densidade de capital empreendedor.


4. Custo de reputação fiscal (efeito sinal)

Mercados funcionam por expectativas.

Ao longo dos anos, a Noruega passa a ser percebida como:

  • país de alto risco regulatório ex post;

  • ambiente onde o sucesso gera penalidade retroativa;

  • jurisdição pouco previsível para fundadores.

Esse “prêmio de risco fiscal”:

  • afasta capital internacional;

  • encarece financiamento;

  • reduz valuation de empresas locais.

Esse custo não aparece no orçamento, mas aparece no crescimento menor.


5. Comparação contrafactual: o que poderia ter sido arrecadado

Economistas trabalham com cenários contrafactuais. Simplificando:

Se parte relevante desses indivíduos tivesse permanecido:

  • pagando impostos sobre renda e ganhos realizados;

  • reinvestindo localmente;

  • mantendo empresas e IP no país;

a arrecadação acumulada ao longo de 20–30 anos tenderia a ser maior do que a obtida com:

  • imposto anual sobre patrimônio;

  • exit tax pontual.

Tributar o fluxo do sucesso gera mais do que tributar o estoque do potencial.


6. O resultado agregado ao longo do tempo

Ao longo de uma ou duas décadas, o prejuízo se manifesta como:

  • crescimento econômico menor;

  • ecossistema empreendedor menos vibrante;

  • fuga permanente de talentos;

  • arrecadação estruturalmente mais baixa;

  • dependência maior de impostos sobre classe média e consumo.

Enquanto isso, países concorrentes:

  • capital humano importado;

  • empresas maduras;

  • arrecadação sem precisar elevar alíquotas.


Estrutura do imposto sobre os ricos na Noruega

A Noruega tributa não apenas renda e ganhos de capital, mas também o estoque de riqueza acumulada, algo relativamente raro entre países desenvolvidos.


Principais características:

  • Imposto sobre patrimônio aplicado a ativos líquidos e ilíquidos (ações, imóveis, participações empresariais).

  • Alíquota total em torno de 1% ao ano, somando imposto nacional e municipal.

  • Incidência independente de o patrimônio gerar ou não renda no período.

  • Em 2022–2023, o governo aumentou a carga efetiva sobre grandes fortunas, elevando a tributação sobre ações e reduzindo benefícios de avaliação patrimonial.

Consequência prática

Para empresários e investidores:

  • O imposto precisa ser pago mesmo em anos de prejuízo.

  • Frequentemente exige venda de ativos ou retirada de capital da empresa para pagar o tributo.

  • Penaliza fortemente quem mantém patrimônio produtivo, mas pouco líquido.


A reação: fuga de ricos para a Suíça

Diante desse cenário, centenas de milionários e bilionários noruegueses mudaram sua residência fiscal para a Suíça nos últimos anos.

Por que a Suíça?

  • Ausência de imposto nacional sobre grandes fortunas, em termos comparáveis aos da Noruega.

  • Cantões com tributação negociada para estrangeiros ricos (forfait fiscal).

  • Estabilidade jurídica, previsibilidade regulatória e proteção patrimonial.

  • Baixa tributação sobre ganhos de capital privados.

  • Ambiente explicitamente pró-investimento e pró-empreendedor.

Na prática, muitos desses contribuintes continuam operando empresas globais, mas passam a pagar impostos em jurisdições mais competitivas.


Impacto fiscal e econômico para a Noruega

Esse movimento gerou um efeito paradoxal:

  • Perda de arrecadação: a saída de poucos indivíduos extremamente ricos elimina receitas muito maiores do que o ganho obtido com o aumento da alíquota.

  • Erosão da base tributária futura, especialmente sobre investimentos e dividendos.

  • Sinal negativo ao empreendedorismo, sobretudo para fundadores de empresas de tecnologia, indústria e energia.

  • Redução indireta de empregos, inovação e reinvestimento local.

Estudos e análises internas indicam que, em vários casos, a Noruega passou a arrecadar menos, não mais, após o endurecimento do imposto.


Efeitos do imposto de saída

1. Startups vivem de opcionalidade, não de liquidez

Quem cria uma startup normalmente:

  • Aceita salários baixos por anos;

  • Acumula patrimônio ilíquido (ações, quotas, stock options);

  • Só realiza ganhos no futuro, se e quando houver um exit, IPO ou venda parcial.

Um imposto de saída sobre ganhos não realizados quebra essa lógica, pois:

  • Transforma um ganho potencial em passivo tributário concreto;

  • Introduz risco fiscal antes da liquidez existir;

  • Cria a percepção de que o Estado “entra como sócio” sem assumir risco.


O empreendedor passa a internalizar o risco tributário no momento zero da decisão de empreender.


2. O efeito psicológico é anterior ao efeito fiscal

Mesmo que o imposto só seja cobrado na saída do país, ele gera um efeito-chave:

“Se eu tiver sucesso aqui, sair depois será caro.”

Isso produz dois comportamentos racionais:

a) Não começar

Empreendedores altamente móveis podem simplesmente:

  • Abrir a empresa em outra jurisdição desde o início;

  • Usar holding estrangeira;

  • Registrar IP (propriedade intelectual) fora do país.

b) Sair cedo demais

Outros optam por:

  • Mudar de país antes da empresa escalar;

  • Transferir residência fiscal antes da valorização significativa;

  • Planejar crescimento já fora da Noruega.

Em ambos os casos, o país perde:

  • Empresas;

  • Empregos qualificados;

  • Centros de decisão;

  • Base tributária futura.


3. Imposto de saída muda o cálculo intertemporal

Do ponto de vista econômico, o imposto de saída:

  • Reduz o valor esperado do sucesso;

  • Aumenta o custo marginal de crescer;

  • Penaliza desproporcionalmente quem cria valor do zero.

Isso é diferente de tributar renda:

  • Renda é fluxo;

  • Exit tax incide sobre estoque futuro incerto.

Para startups, isso equivale a dizer:

“Se der certo, você paga antes de receber.”


4. Comparação implícita com países concorrentes

Empreendedores não escolhem países por ideologia, mas por previsibilidade e simetria de risco.

Quando comparam:

  • País A: imposto alto + imposto de saída;

  • País B: imposto menor + neutralidade na saída;

o incentivo é claro:

  • Assumir risco onde o upside não é penalizado retroativamente.

Por isso, países como a Suíça, Estônia, Reino Unido (em certos regimes) e até Portugal, em fases recentes, tornam-se polos de atração para fundadores, não por serem “paraísos fiscais”, mas por não punirem o sucesso futuro.


5. O paradoxo: proteger arrecadação hoje, perder amanhã

O imposto de saída nasce com o objetivo de:

  • “Proteger a base tributária”;

  • Evitar que grandes fortunas escapem.

Mas, na prática, ele pode:

  • Encolher o pipeline de futuras grandes fortunas;

  • Reduzir exits, IPOs e inovação local;

  • Fazer com que o país arrecade menos no longo prazo, não mais.

Economicamente, isso é um caso clássico de miopia fiscal.

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