Por que as passagens aéreas para Natal são sempre caras?
- Ricardo Gurgel

- 6 de set.
- 5 min de leitura
Atualizado: 13 de set.
O novo aeroporto de Natal encareceu bastante o deslocamento entre o terminal e os hotéis. Como o destino é turístico, a maioria deles fica no lado oposto da cidade, o que aumenta não apenas o tempo de trajeto, mas também o custo do translado. Esse fator, somado ao desgaste natural da viagem, faz com que muitos turistas, passageiros por escolha, considerem destinos alternativos. Menos passageiros para dividir os custos do voo resulta no óbvio: o impacto no bolso. É como em um jantar com muitos pratos, mas poucos pagando a conta, o avião também precisa “jantar” combustível, manter sua operação com funcionários em solo e no ar, além de arcar com uma série de outros custos inevitáveis.
Elementos que desestimulam o passageiro
Maior custo de translado do aeroporto ao hotel.
Maior tempo de trânsito e desgaste até chegar ao destino.
A segurança do trajeto é bem mais exigida, a rota realmente tem pontos de atenção
Exemplo ilustrativo:
Antigo aeroporto Augusto Severo → Hotel Praiamar (Ponta Negra)


Aeroporto atual (São Gonçalo do Amarante) → Hotel Praiamar


O novo trajeto representa cerca de 30 km a mais, ou seja, 3,3 vezes a distância do antigo aeroporto, além de expor o passageiro a trechos mais desertos, com registros de assaltos. Para quem chega cansado, perder esse tempo adicional é um grande desestímulo, sobretudo no quesito segurança.
Durante algum tempo, a iluminação não foi satisfatória nos quase 10 km ladeados por mata. Hoje essa questão está resolvida, mas ainda assim não se trata de um trecho que possa ficar sem vigilância. Sem esse cuidado, a boa iluminação não será suficiente, já que o vazio continua sendo um convite a ações contra turistas e passageiros que circulam em direção ao aeroporto.
E reforço: quanto menos passageiros, pior fica o rateio dos custos e, consequentemente, mais cara a passagem. Embora hoje me sinta um pouco mais seguro nesse percurso, não posso esquecer que ele já viveu períodos críticos.
De 13 para 43 Km
Um trajeto que equivale a 3,3 vezes a quilometragem do antigo e esse ingrediente de aventura acentuada!

Fatores econômicos que encarecem a passagem
1. Rateio dos custos, nosso maior spot do texto
De forma simplificada: levantar um avião custa caro, e esse custo é diluído entre os passageiros. Quanto menos gente se interessa pela rota, mais cara fica a passagem, ou a empresa simplesmente realoca o avião para uma rota mais rentável.
2. Natal como “fim de linha”
Natal não é um hub aéreo. Diferente de Recife, que funciona como ponto de conexão e atrai várias companhias para preencher assentos intermediários, Natal fica como destino final. Isso encarece o bilhete porque a aeronave precisa cobrir o custo integral da rota com menos oportunidades de ocupação intermediária.
3. “Mas se fosse mais barato, lotaria os voos!”
Nem sempre. Um avião mais cheio significa maior peso e mais combustível queimado. Muitas vezes é mais lucrativo operar voos com 70% da ocupação a preços altos do que encher todos os assentos a preços baixos.
4. “Mas os voos estão sempre lotados e continuam caros!”
Isso ocorre porque as companhias reduziram a oferta de voos. Assim, mesmo com lotação alta, a passagem continua cara: a estratégia é equilibrar a menor procura com maior preço médio pago pelos que realmente precisam viajar.
E nacionalmente?
Além das questões específicas de Natal, existe uma bagagem nacional de fatores que mantêm o setor aéreo em um processo de “gigantismo contido”. O Brasil é um país de enorme movimento, mas isso não significa que esteja explorando todo o seu potencial. Se a competitividade fosse equivalente, ao menos, à média global de operações, o cenário já seria bem diferente. Nem precisamos recorrer a comparações com países de baixa exigência regulatória: se as condições competitivas fossem semelhantes às da Europa, já teríamos alcançado uma dimensão mais ampla, robusta e sustentável. A seguir, alguns pontos que continuam a prejudicar o setor:
Sobre multas e regulação
Quando se fala em multas do Procon contra companhias aéreas por preços “abusivos”, o efeito prático é quase nulo. As empresas recorrem, e mesmo quando pagam, podem simplesmente cortar voos da rota. Isso já aconteceu em Natal, e reduz ainda mais a oferta.
O problema da concorrência
Voar no Brasil é muito lucrativo, mas também altamente arriscado. Existem enormes barreiras para entrada de novas empresas. Algumas razões:
98,5% dos processos judiciais contra aéreas no mundo vêm de passageiros brasileiros.
Impostos e taxas podem representar 30% a 40% do valor da passagem.
Aviação é, por natureza, um setor de alto custo e alta exigência técnica.
Esse cenário dificulta a entrada de empresas low-cost no Brasil. O modelo europeu, baseado em serviços extras pagos a bordo, provavelmente não sobreviveria aqui — já que restrições regulatórias impediriam práticas como a venda ampla dentro do avião, que subsidia tarifas baratas.

Sempre mais caras que a maior parte das outras capitais
É preciso fazer uma justiça: as passagens para Natal, tanto de chegada quanto de saída, já tinham certo destaque negativo mesmo na época em que o aeroporto em operação era o Augusto Severo. No entanto, essa diferenciação se acentuou pelos motivos que já citamos.
Não fiz um levantamento preciso dos custos acumulados com essa mudança, mas, se a estagnação persistir, chegará o momento em que apenas grandes alterações logísticas poderão tornar viável o fluxo entre aeroporto e cidade. Caso contrário, corremos o risco de olhar para trás com saudades e até cogitar o retorno ao Augusto Severo, ainda que hoje isso nem seja juridicamente viável. A quebra de contratos colocaria em risco não apenas a confiança local, mas também a credibilidade nacional sobre o modelo de concessões. E, convenhamos, por aqui o grupo certamente adoraria uma mudança de endereço.
Olha o que encontrei dias após minha postagem: Turismo do RN cai 2,7% em julho e tem o pior resultado do Nordeste, aponta IBGE. A postagem original foi feita em 12/09/2025(link:https://www.instagram.com/p/DOhFoqLEbPJ/?igsh=MWs1dXRsbmZyMW9icA%3D%3D)

Passagens aéreas baratas
No Brasil, a única chance de reduzir de forma consistente o preço das passagens passa por dois fatores centrais: corte no custo operacional e segurança jurídica para as companhias aéreas. Hoje, as empresas precisam reservar parte significativa de seus recursos para enfrentar a avalanche de processos judiciais movidos por passageiros — o que já coloca o país como líder mundial nesse tipo de demanda.
Enquanto esse cenário não muda, não há mágica: preço baixo de verdade só viria com a entrada de companhias low cost. Porém, aí está outro problema: muitas das práticas que permitem a essas empresas vender passagens baratas na Europa ou nos Estados Unidos simplesmente são proibidas no Brasil. Cobrança por serviços extras, venda ampla de produtos a bordo e outras fontes de receita secundária não encontram espaço aqui, o que inviabiliza o modelo.
Mais concorrência poderia, sim, ajudar. Se houvesse espaço para novas empresas, poderíamos ter rotas alternativas como Natal–Belém ou Natal–Manaus, que transformariam Natal em ponto intermediário estratégico e ajudariam a diluir custos. Mas, sem reformas regulatórias e jurídicas que reduzam riscos e abram margem para inovação comercial, continuaremos presos ao mesmo dilema: tarifas altas e pouca oferta.












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