O DRM pode tornar as ondas curtas economicamente atraentes
- Ricardo Gurgel

- 20 de jul.
- 9 min de leitura
Atualizado: 25 de jul.
A Flexibilidade do DRM
O DRM (Digital Radio Mondiale) é um sistema de radiodifusão digital altamente flexível. A possibilidade de reduzir a qualidade do áudio transmitido pode parecer contraditória à primeira vista, mas está diretamente ligada à robustez do sinal: quanto menor a quantidade de dados transmitidos, maior a chance de o receptor conseguir decodificar o som de forma estável, mesmo em condições adversas. Ou seja, há uma troca entre qualidade e estabilidade, especialmente útil em áreas de recepção fraca.
Eficiência energética: economia e sustentabilidade
O DRM não se destaca apenas pela flexibilidade de transmissão, mas também pela eficiência energética. Comparado aos sistemas analógicos, ele permite cobrir distâncias semelhantes consumindo menos energia, seja em ondas curtas, médias ou VHF. Essa vantagem reduz custos operacionais e pode tornar economicamente viável a operação de rádios em regiões remotas.
Alcance global ou qualidade nacional?
As ondas curtas sempre tiveram como principal atrativo o alcance internacional. Com o DRM, é possível escolher entre uma transmissão com som de altíssima qualidade (ideal para audiências nacionais ou regionais) ou optar por maior robustez para atingir distâncias transcontinentais com som mais simples. Para emissoras comerciais, faz mais sentido cativar o público nacional com áudio de excelência do que tentar alcançar ouvintes em países distantes com baixa fidelidade sonora.
Paradoxo do alcance internacional
Vale a pena uma rádio romena tentar conquistar ouvintes no Brasil com som de baixa qualidade?
Na prática, não. O ouvinte brasileiro que se interessa por uma emissora romena tenderá a buscar a versão em streaming, cuja qualidade geralmente é muito superior. A baixa bitrate, usada para tentar garantir a captação em longas distâncias, destrói o encanto sonoro — e com ele, o interesse.
Chamada ao realismo 1: Uma rádio com som a 8 kbps não cativa, mesmo que atinja outro continente.
Chamada ao realismo 2: Ao tentar alcançar países distantes com som pobre, a emissora sacrifica a experiência dos ouvintes próximos, que poderiam ser seu público principal.
Alternativa realista: foco regional com excelência sonora
Em vez de sacrificar a qualidade para alcançar continentes, uma rádio poderia optar por configurar sua transmissão DRM para cobrir com primor grande parte do próprio país ou regiões vizinhas. Isso traria reconhecimento local e regional, fortalecendo a marca e até atraindo ouvintes globais por outros canais, como o streaming.
Novas possibilidades competitivas com o DRM
Cobertura nacional sem rede de retransmissoras: algo antes impossível para FMs, torna-se plausível com ondas curtas em DRM.
Construção de público local com alta qualidade: um novo paradigma para rádios em OC, antes focadas apenas no alcance.
Experiência sonora comparável ao FM: agora possível nas ondas curtas, o que eleva o nível de engajamento.
Eliminação de ruídos e interferências: uma das maiores barreiras da OC analógica é resolvida no digital.
O renascimento econômico das ondas curtas
Com a chegada do DRM, as ondas curtas deixam de ser apenas ferramentas de diplomacia estatal ou evangelização para se tornarem, potencialmente, plataformas comerciais viáveis. Isso porque:
A qualidade sonora alcança patamares antes impossíveis na OC;
A estabilidade de recepção é superior até mesmo ao FM;
O sistema é flexível e escalável, adaptando-se a diferentes realidades e objetivos.
Redefinindo o papel das ondas curtas
Historicamente, a OC foi usada em contextos geopolíticos, religiosos ou emergenciais. Hoje, com o DRM, surgem novos cenários:
Missões educativas e humanitárias: transmissões de baixa bitrate com foco em robustez podem alcançar regiões isoladas da África, Ásia e Oceania com conteúdo vital — inclusive sem fins lucrativos.
Diplomacia regional inteligente: em vez de buscar o mundo todo com baixa qualidade, rádios podem priorizar qualidade em um raio de 1000 km, criando laços mais fortes com países vizinhos.
Cobertura emergencial e militar: a robustez do DRM em baixa bitrate é ideal para situações de guerra ou catástrofes, onde qualquer recepção, mesmo mínima, é valiosa.
A lógica para transmissões de longa distância com qualidade
Se uma emissora deseja ser relevante internacionalmente, deve investir em:
Potente sistema irradiador (transmissores de alta potência + antenas de alto ganho);
Processamento de áudio profissional;
Bitrate suficiente para entregar som envolvente.
Reduzir a qualidade para alcançar mais longe apenas dispersa esforços e compromete o engajamento. Não se conquista relevância internacional com som mono a 8 kbps.
E o Brasil?
Até aqui, a OC no Brasil teve três principais finalidades:
Religiosa
Institucional/governamental
Internacionalização
Contudo, essas operações:
Têm pouca ou nenhuma medição de audiência;
Não atraem anunciantes comerciais;
Enfrentam custos técnicos elevados;
Operam sob legislação rígida e com conteúdo limitado.
O DRM pode mudar esse cenário.
O Brasil tem, com ele, a chance de se posicionar regionalmente em OC com relevância cultural, técnica e comercial. Para isso, é preciso:
Estimular emissoras AM e OC a adotarem o DRM com qualidade sonora;
Promover o desenvolvimento de receptores modernos, acessíveis e com boa experiência de áudio;
Criar novos modelos de negócios baseados na exportação de conteúdo, educação a distância e serviço público.
Uma nova fronteira para o rádio comercial
1. Cobertura nacional e regional com estrutura enxuta
Antes, apenas grandes redes de FM podiam cobrir todo um país, com dezenas de retransmissoras. Agora, com uma única transmissão em ondas curtas em DRM, é possível alcançar:
Um raio de até bem maior com qualidade e pureza;
Regiões rurais e remotas sem necessidade de infraestrutura física adicional;
Áreas internacionais próximas, como países vizinhos, criando audiência de exportação.
Isso cria um novo modelo de negócio para rádios locais com perfil regional ou nacional.
2. Monetização via novos nichos de mercado
O DRM permite que emissoras foquem em nichos comerciais antes inalcançáveis, como:
Agronegócio, com boletins em regiões rurais;
Turismo de fronteira, com programação bilíngue;
Exportação cultural, com música brasileira para países lusófonos (África, Caribe);
Conteúdo educacional patrocinado, em parcerias com ONGs ou governos;
Transmissões B2B (business-to-business), como boletins econômicos ou náuticos.
3. Integração com o digital e com o streaming
O DRM transmite áudio + dados + serviços interativos, como:
Slides com imagens ou mensagens publicitárias;
Informações em texto (Journaline);
Alertas de emergência ou campanhas públicas.
Isso permite formatos publicitários inovadores — como vinhetas com reforço visual, patrocínio de serviços e até vendas de produtos com códigos integrados.
4. Operação mais barata e escalável
Com o DRM, uma emissora comercial pode:
Usar menos potência elétrica;
Ter processo técnico mais simples que uma rede FM;
Reduzir interferências e ruídos, aumentando a permanência do ouvinte;
Evitar os altos custos de concessões FM em grandes capitais.
O resultado é um custo por ouvinte muito menor, com maior margem de retorno.
5. Possibilidade de criação de marcas com influência internacional
Se bem operada, uma rádio em DRM pode se tornar referência em:
Conteúdo cultural exportável (música, notícias, opinião);
Cobertura de crises e emergências, com prestígio internacional;
Alcance de comunidades específicas, como imigrantes ou falantes de uma língua minoritária.
O modelo não precisa ser massivo. Pode ser premium, segmentado e ainda assim viável.
6. Novos modelos híbridos com receptores acessíveis
Com a popularização de receptores DRM:
Uma rádio em OC pode ser ouvida em celulares, tablets ou caixas de som;
Pode haver venda casada: marcas que patrocinam a distribuição de receptores com programação segmentada;
Pode atuar como rádio comunitária regional com padrão técnico elevado, atingindo mais ouvintes com menos recursos.
Para ver (e ouvir) a diferença com seus próprios olhos
Como questão final, convido você a assistir a este vídeo que já destaquei em artigos anteriores, mas que continua sendo uma demonstração poderosa.
Trata-se de uma captação feita no interior do Brasil de uma emissora norte-americana transmitindo em ondas curtas, em dois modos simultâneos: analógico convencional e digital DRM.
O que se ouve é revelador.
A diferença é clara: o salto de qualidade sonora proporcionado pelo DRM transforma completamente a experiência do ouvinte. E isso, mesmo em uma gravação ambiente, com recepção feita em território brasileiro, a milhares de quilômetros da estação transmissora.
Se existisse uma tal "Recife DRM Ondas Curtas"
Seria possível cobrir Natal (RN), João Pessoa (PB) e Maceió (AL) a partir de Recife (PE) com um canal de ondas curtas em DRM, desde que algumas condições técnicas sejam atendidas.
Recife (PE) - Estimativa 2024: 1,5 milhão de habitantes
(região metropolitana de Recife estimada em 3.7 milhões de habitantes)
Maceió (AL) - Estimativa 2024: cerca de 994 464 habitantes
(região metropolitana de Maceió estimada em 1,3 milhão de habitantes)
João Pessoa (PB) - Estimativa 2024: cerca de 888 679 habitantes
(região metropolitana de Maceió estimada em 1,3 milhão de habitantes)
Natal (RN) - Estimativa 2024: cerca de 800 mil habitantes
(região metropolitana de Maceió estimada em 1,2 milhão de habitantes)
Fatores que favorecem essa cobertura:
Distâncias relativamente curtas:
Recife → Natal ≈ 285 km
Recife → João Pessoa ≈ 120 km
Recife → Maceió ≈ 260 km
Essas distâncias são confortavelmente cobertas pelas ondas curtas, especialmente durante o dia com frequência em 9 MHz (31 metros) ou à noite em 7 MHz (41 metros).
Tecnologia DRM:
O DRM é muito mais eficiente energeticamente do que o analógico tradicional com som estéreo e robustez contra ruídos.
Condições diurnas e noturnas:
Durante o dia, a propagação em 9–13 MHz pode alcançar essas cidades com estabilidade e boa qualidade de som.
Durante a noite, 7 MHz funciona ainda melhor, com chances de sinal forte e estável a longa distância.
Cuidados e limitações:
Interferência local (QRM) pode atrapalhar a recepção em áreas urbanas se não houver um bom receptor com filtragem adequada.
Condições atmosféricas e do ciclo solar podem influenciar um pouco a estabilidade, mas na distância entre essas capitais, o impacto é pequeno.
É crucial usar um bitrate equilibrado para garantir robustez e qualidade sem sacrificar alcance.
Um transmissor DRM de ondas curtas em Recife, é totalmente viável cobrir Natal, João Pessoa e Maceió com excelente qualidade de áudio, especialmente se o sistema for bem projetado em termos de frequência, potência e antena. Esse tipo de uso regional das ondas curtas com DRM pode ser uma solução moderna, econômica e eficaz para cobrir múltiplas capitais nordestinas com uma única estação.
Se existisse uma tal "Recife DRM AM"
Se fosse um canal em DRM na faixa de AM (ondas médias) operando a partir de Recife, a cobertura para Natal, João Pessoa e Maceió seria mais limitada em comparação com as ondas curtas, mas ainda viável, dependendo de algumas condições técnicas e estratégicas.
O que favorece o uso do DRM em AM (ondas médias):
Alta eficiência do DRM em AM:
O DRM é extremamente eficiente também na faixa de AM.
Banda AM disponível e sem congestionamento:
No Brasil, a faixa de AM está praticamente livre, o que permite transmissões digitais puras (DRM puro) sem interferência de estações analógicas próximas, o que é ideal para o funcionamento do sistema.
Custo mais baixo de operação:
Transmissores em AM têm custo mais acessível do que em ondas curtas, tanto na aquisição quanto no consumo de energia, especialmente com o uso do DRM.
Alcance estimado a partir de Recife com DRM em AM:
Durante o dia (onda de solo):
João Pessoa (120 km) – cobertura bastante provável com qualidade.
Maceió (260 km) – possível, mas com atenuação. Antena bem ajustada pode ajudar.
Natal (285 km) – limítrofe para onda de solo. Pode exigir potência maior ou antena direcional.
Durante a noite (onda celeste):
As três cidades podem ser alcançadas com sinal estável e de boa qualidade, desde que a frequência seja escolhida adequadamente para propagação noturna e a antena tenha ganho suficiente.
Limitações do DRM em AM:
Alcance menor que ondas curtas durante o dia, já que a onda de solo em AM sofre mais atenuação com a distância.
Mais sensível a ruído urbano (QRM), especialmente em áreas densamente povoadas.
Um canal DRM em AM transmitido de Recife poderia cobrir João Pessoa com boa qualidade durante o dia, e chegar a Natal e Maceió especialmente à noite, com sinal digital estável e estéreo. Com uma boa antena e potência moderada (3 a 5 kW), essa cobertura seria realista.
Entretanto, ondas curtas ainda oferecem mais alcance regional com menor potência, sendo a melhor escolha se a intenção for cobrir várias capitais nordestinas simultaneamente em todas as horas do dia.
Se o foco for a região metropolitana de Recife e cidades num raio de até 150 km, o DRM em AM pode ser uma solução extremamente eficiente e econômica, aproveitando a faixa hoje subutilizada.
Mudanças?
O DRM redesenha completamente o que é possível nas ondas curtas. Sai o modelo caro, estatal, ultrapassado. Entra a rádio enxuta, digital, comercial, escalável e relevante, com:
Qualidade de áudio comparável ao FM;
Cobertura nacional e internacional;
Custo operacional baixo;
Potencial de monetização por publicidade, parcerias, serviços e marca.
Se o Brasil quiser democratizar a presença regional de rádios comerciais, com qualidade e sustentabilidade, as ondas curtas em DRM são uma porta ainda pouco explorada, mas altamente promissora.
A chegada do DRM transforma radicalmente o papel das ondas curtas no mundo moderno.
Pela primeira vez, é possível aliar alcance internacional com qualidade sonora real, rompendo a lógica antiga em que cobrir grandes distâncias exigia sacrificar a experiência do ouvinte.
Ao mesmo tempo, a eficiência energética e a flexibilidade do sistema permitem que emissoras de diferentes portes explorem esse espectro de forma economicamente viável, seja para fins comerciais, educacionais ou de interesse público.
Em um mundo onde o rádio ainda é a única ponte para milhões de pessoas em áreas remotas, a combinação de DRM e ondas curtas pode devolver relevância global a um meio historicamente subestimado.
Cabe às emissoras, governos e fabricantes decidirem: usar o potencial pleno desse sistema para construir presença, influência e utilidade real, ou seguir desperdiçando uma das faixas mais poderosas já atribuídas ao rádio.












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