O analfabetismo financeiro nos leva ao retardo econômico
- Ricardo Gurgel

- 16 de out.
- 5 min de leitura
Fomentadora de crescimento
A função primordial de uma bolsa de valores não é ser um “cassino”, e sim canalizar recursos de poupadores e investidores para empresas que precisam de capital para crescer.
Quando uma empresa lança ações (num IPO ou em novas ofertas), ela está captando dinheiro para investir em infraestrutura, tecnologia, pesquisa, contratação de pessoal ou expansão internacional.
Esses recursos não vêm de empréstimos bancários com juros altos, mas sim de investidores que se tornam sócios e dividem riscos e lucros.
Exemplo prático: empresas como Amazon, Google, Tesla ou Mercado Livre não teriam conseguido crescer no ritmo que cresceram sem o mercado de capitais. As rodadas de captação em bolsa financiaram desde laboratórios de inteligência artificial até centros de distribuição automatizados.
O papel estratégico no surgimento de novas indústrias digitais
A bolsa cria um ambiente fértil para o surgimento de setores inteiros:
Startups de tecnologia conseguem expandir após abrir capital, pois captam bilhões para investir em inovação.
Empresas industriais ligadas ao digital, como fabricantes de chips, robótica, semicondutores, veículos elétricos ou datacenters, usam recursos do mercado para escalar produção e competir globalmente.
Infraestruturas intangíveis, como plataformas de nuvem, inteligência artificial ou biotecnologia, também florescem porque o mercado de capitais aceita investir no longo prazo em projetos que demoram anos para gerar lucro.
Em economias mais desenvolvidas, a bolsa funciona como motor de industrialização moderna. Não se trata apenas de software, mas também de todo o ecossistema industrial que o digital exige: fábricas automatizadas, redes 5G, chips de IA, robôs, baterias, satélites etc.
O mito do “cassino”: uma visão míope e perigosa
A ideia de que a bolsa é um “cassino” surge de uma confusão entre especulação de curto prazo e investimento produtivo:
Especuladores buscam ganhos rápidos com base em volatilidade, e sim, isso existe, mas é apenas a superfície do sistema.
Por baixo dessa camada especulativa está o verdadeiro mecanismo de crescimento econômico, onde empresas financiam inovação, modernizam setores inteiros e criam milhões de empregos.
A mídia muitas vezes reforça essa visão simplista porque é mais fácil vender manchetes sobre “ganhos e perdas” diários do que explicar o impacto estrutural que o mercado tem no desenvolvimento de setores estratégicos. Essa narrativa limitada faz com que muitos cidadãos e políticos subestimem a importância do mercado de capitais como instrumento de política industrial.
Motor
A bolsa de valores, quando bem regulada e utilizada com visão estratégica, é um dos motores centrais da economia do século XXI. Ela:
Transforma poupança em capital produtivo.
Impulsiona setores industriais de alta tecnologia.
Cria ecossistemas inteiros ao redor do digital.
Acelera o progresso científico e tecnológico.
Reduzir tudo isso à metáfora de “cassino” é como chamar uma usina de foguetes de “brinquedo”: ignora o papel estrutural que ela tem no desenvolvimento de sociedades modernas.
Por que outros países cobram impostos sobre dividendos
Muitos países desenvolvidos, como Estados Unidos, Alemanha, França ou Japão, existe tributação sobre dividendos. Mas há um detalhe crucial que quase nunca é explicado no Brasil: nessas economias, a carga tributária ao longo da cadeia produtiva é muito menor.
As empresas pagam impostos reduzidos sobre produção, folha de pagamento e insumos.
O Estado opta por deixar o processo produtivo fluir com o mínimo de obstáculos, incentivando investimentos, expansão industrial e geração de empregos.
A ideia é que a riqueza seja criada primeiro e só depois, quando distribuída aos acionistas na forma de dividendos, o Estado cobre sua parte.
Ou seja: a tributação sobre dividendos lá fora não é “mais um imposto”, e sim parte de um sistema equilibrado, pensado para não sufocar a atividade produtiva.
O caso brasileiro: a inversão do modelo
No Brasil, a realidade é completamente diferente. Nossa estrutura tributária:
Cobra muito antes que a riqueza seja gerada sobre insumos, máquinas, folha de pagamento, energia, transporte e praticamente cada etapa da produção.
Penaliza a indústria com tributos cumulativos e complexos, que encarecem o produto final e reduzem a competitividade.
Além disso, já tributa fortemente o lucro das empresas no Imposto de Renda e na CSLL.
Nesse cenário, acrescentar um imposto sobre dividendos não corrige distorções, piora o problema. Em vez de tornar o sistema mais justo, cria-se um efeito de “tributação em cascata”, no qual o Estado tira fatias sucessivas do mesmo dinheiro em todas as etapas, desde a produção até a distribuição do lucro.
O risco: aprofundar o abismo econômico
Se o Brasil insistir em copiar apenas o “imposto sobre dividendos” sem copiar também o modelo de tributação leve e racional sobre a produção, o resultado será perverso:
Menor atração de investimentos produtivos, porque o retorno líquido diminui.
Redução da competitividade internacional da indústria e das startups.
Fuga de capitais e talentos, que buscarão ambientes fiscais mais eficientes.
Menor geração de empregos e inovação, travando o desenvolvimento econômico.
Em outras palavras: em vez de corrigir desigualdades, o país aprofunda o abismo entre quem produz e quem arrecada.
Tributar dividendos só faz sentido em um sistema fiscal que libera a produção para crescer. Se a cadeia produtiva já é sufocada por impostos, cobrar também no fim do processo é como punir duas vezes quem investe, arrisca e gera riqueza. No caso brasileiro, isso não traria justiça social, traria estagnação.
Aumentar impostos e taxas pode não resultar em arrecadar mais!
!O que aconteceu com a taxa das blusinhas!
Quando o governo decidiu cobrar imposto sobre pequenas importações feitas por pessoas físicas em plataformas como Shopee, AliExpress, Shein e Temu, a justificativa oficial era simples: “igualar a concorrência com o varejo nacional” e aumentar a arrecadação.
Na prática, porém, o resultado foi o oposto do esperado:
As compras internacionais de baixo valor despencaram.
O fluxo de pacotes que passavam pelos Correios caiu drasticamente.
Com isso, a estatal perdeu receita em fretes, serviços logísticos e taxas de despacho aduaneiro.
Ou seja: ao tentar ganhar mais com a nova tributação, o governo reduziu a base tributária total e encolheu a arrecadação indireta.
Menos consumo = menos receita
Esse fenômeno tem nome na economia: efeito de retração da base tributária. Quando o imposto ultrapassa um certo limite, ele deixa de gerar aumento de receita e começa a desestimular o consumo e a atividade econômica, diminuindo o total arrecadado.
No caso da “taxa das blusinhas”:
Milhões de consumidores deixaram de comprar.
Pequenas remessas internacionais diminuíram drasticamente.
E com isso, não apenas o imposto sobre as compras ficou abaixo do previsto, mas também todas as receitas acessórias (fretes, armazenagem, transporte interno) caíram junto.
Esse mesmo mecanismo explica por que países que apostam em baixa carga tributária sobre consumo muitas vezes arrecadam mais no total: a economia cresce, a base de contribuintes se amplia e o volume movimentado compensa alíquotas menores.
Uma lição de política fiscal: preço e quantidade importam
A experiência da taxa das blusinhas traz uma lição importante:
Tributos não são apenas números, são incentivos e desincentivos econômicos.
Ao elevar impostos sem entender como o mercado reage, o governo pode matar a própria fonte de receita.
Em outras palavras, não existe arrecadação sustentável sem atividade econômica sustentável. Se o imposto sufoca a atividade, a base tributária encolhe, e o Tesouro arrecada menos, não mais.
A queda nas receitas dos Correios após a taxa das blusinhas é uma prova empírica de que subir impostos não garante mais dinheiro no caixa. Em muitos casos, acontece exatamente o oposto: a economia desacelera, a demanda desaparece e o Estado arrecada menos. Política fiscal inteligente é aquela que entende essa dinâmica e cria um equilíbrio entre arrecadação e estímulo econômico.
Que tal essa equação?
Mais investimento + mais atividade econômica = mais riqueza e, naturalmente, mais arrecadação!









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